Experimentação, Filosofia, Política

Capitalismo e Esquizofrenia | entrevista de Deleuze e Guattari

“Pode-se mesmo falar de uma espécie de parafrenização da linguagem militar, ou então, nesse momento, da linguagem dos militantes políticos. (...) Podemos nos perguntar se as expressões dos militares, dos políticos, dos cientistas não são em realidade, muito exatamente, uma espécie de antiprodução, uma espécie de trabalho de repressão no nível da expressão cujo objetivo é parar o trabalho de questionamento, trabalho incessante, transbordante, que se perde simplesmente no movimento real das coisas.”.

Experimentação, Filosofia

Causas e razões das ilhas desertas | Gilles Deleuze

A ilha é o mínimo necessário para esse recomeço, o material sobrevivente da primeira origem, o núcleo ou o ovo irradiante que deve bastar para re-produzir tudo. Evidentemente, isso tudo supõe que a formação do mundo se dê em dois tempos, em dois estágios, nascimento e renascimento; supõe que o segundo seja tão necessário e essencial quanto o primeiro; supõe, portanto, que o primeiro esteja necessariamente comprometido, que ele tenha nascido para uma retomada e já re-negado numa catástrofe. Somente há um segundo nascimento porque houve uma catástrofe e, inversamente, há catástrofe após a origem porque deve haver, desde a origem, um segundo nascimento. Podemos encontrar em nós a fonte desse tema: para apreciar a vida, nós a alcançamos não em sua produção, mas em sua reprodução. O animal, cujo modo de reprodução se ignora, ainda não ocupou lugar entre os vivos. Não basta que tudo comece, é preciso que tudo se repita, uma vez encerrado o ciclo das combinações possíveis. A segunda origem, portanto, é mais essencial que a primeira, porque ela nos dá a lei da série, a lei da repetição, da qual a primeira origem apenas nos dava os momentos.

Experimentação, História, Política

Poder e Velocidade | por Elias Canetti

"Imitado pelos homens, o raio foi transformado numa espécie de arma: a arma de fogo. O clarão e o estrondo do tiro, o fuzil e particularmente os canhões sempre provocaram o medo dos povos que não os possuíam: estes os percebiam como o raio. (...) Ainda antes, porém, os esforços do homem caminhavam já na direção de torná-lo um animal mais veloz. A domesticação do cavalo e o desenvolvimento dos exércitos de cavaleiros, em sua forma mais completa, conduziram às grandes invasões históricas provenientes do Oriente. Todos os relatos da época acerca dos mongóis destacam quão velozes eles eram. Sua aparição era sempre inesperada: eles surgiam tão repentinamente quanto desapareciam, e reapareciam de maneira ainda mais abrupta. Sabiam converter em ataque até mesmo a pressa da fuga: mal se começava a crer que haviam fugido, estava-se já novamente cercado por eles. Desde sempre, a velocidade física, como característica do poder, intensificou-se de todas as formas. Desnecessário faz-se abordar seus efeitos sobre nossa era tecnológica."

Experimentação, Filosofia, História, Política, Semiologia

“Fuck”, “Sex”, “Tech” e “Gênero”: quando a América afunda.

"(...) Com “cis-gênero” as coisas se embaralham: uns dizem que a pessoa cis gênero é aquela que aceita o sexo que lhe destinou o nascimento; outras dizem que é aquele que aceita o gênero destinado no nascimento; outras que são “os indivíduos dos quais o gênero de nascimento, o corpo e a identidade pessoal coincidem” (entenda quem puder); outras falam de cissexual para descrever “as pessoas que não são transsexuais e que sempre conceberam seus sexos físico e mental alinhados”. Enfim, ser cis gênero é ser singularmente demarcado, sexista, normativo e normalizado. E será ainda mais se se insurgir contra a ideia (aberrante de um ponto de vista biológico) de que o sexo possa ser “destinado” no nascimento, e se se persiste em pensar – é o meu caso – que o sexo é constatado no nascimento, da mesma maneira que constatamos que o recém-nascido tem dois olhos, um nariz, etc.".

Experimentação, Filosofia, Política

A coerência do estoicismo: uma alface por um óbolo

O que podem nos ensinar essas reflexões estoicas? Em primeiro lugar, parece-me que encontramos nas reflexões acima uma resposta à tendência atual de querer tudo, imediatamente, sem que nada nos seja pedido em troca. E a multiplicação das amostras grátis, das degustações gratuitas e dos presentinhos que a publicidade nos oferece não podem senão nos confirmar nessa tendência. Há nos estoicos ao contrário uma noção de sacrifício tornado necessário para se obter os verdadeiros privilégios, os verdadeiros bens. Ao entusiasmo atual com tudo o que é dado gratuitamente opõe-se a sabedoria estoica que reestabelece um preço ao que importa verdadeiramente.

Arte, Experimentação, Filosofia

País de dançarinos e de ritmos mancos | por Jérôme Cler

A impossibilidade da leveza, a elegância insensata dos dançarinos – entretanto frequentemente bastante corpulentos -, a alegria como virtude no centro desse mundo de onde todo pathos parecia estar ausente. Potência da repetição: a música pega sempre no seu círculo, nada mais do que um círculo ou uma espiral, e a melodia de dança se fecha sobre si mesma, na vila, e se junta em direção ao seu centro sempre aproximado pelos dançarinos.

Arte, Experimentação, Filosofia

O corpo no cinema de John Cassavetes | por Viviane de Lamare

'Dar' um corpo, dirigir uma câmera sobre o corpo, assume outro sentido: não se trata mais de seguir e acuar o corpo cotidiano, mas de fazê-lo passar por uma cerimônia, (...) que faz dele um corpo grotesco, mas também extrai dele um corpo gracioso ou glorioso, para atingir enfim o desaparecimento do corpo visível

Arte, Experimentação, Semiologia

Jean-Luc Godard: Aprendisagem do Descontínuo

por Ruy Gardnier Jean-Luc Godard: Aprendisagem do Descontínuo A nuca de Jean Seberg. Ou de Patricia Franchini, pois é ela a personagem, filmada de trás, flagrada no assento do carona de um conversível passeando pelas ruas de Paris. Enquanto ela conversa com o namorado-motorista, que permanece fora de quadro, a imagem salta diversas vezes, cortando… Continuar lendo Jean-Luc Godard: Aprendisagem do Descontínuo

Experimentação, Filosofia

Gilles Deleuze: um misticismo ateu | por René Schérer

Ora, esse misticismo, ele é possível; o problema é bem colocado, e central – Fourier teria escrito pivotal, ou ocupado um lugar privilegiado – dessa aliança entre o empirismo e o misticismo; entre a ordem dos fatos e o que Kant chamava, no seu opúsculo sobre Os sonhos de um visionário, a perda no transcendente. Obstáculo a contornar, ou melhor, pedra de toque de uma reviravolta paradoxal. Posta assim em evidência, logo à entrada, essa pedra é advertência e signo de reconhecimento. Não entre aqui quem não seja místico.

Arte, Experimentação

Deus é tsunami. Deus é geleira despencando. | Elke Maravilha

"Deus é tsunami. Deus é geleira despencando, deus é tempestade de neve, deus é tempestade de areia. As religiões nos atrapalharam muito. O que essas religiões fizeram? Fora o budismo. O cristianismo, eu adoro Cristo, mas Cristo só trata do homem. E a floresta, que é nossa irmã? E a pedra, que é nossa irmã? E o cavalo? E o rato? E o vírus da Aids? E o tubarão? São todos nossos irmãos."

Arte, Experimentação, Filosofia

Gilles Deleuze: A Imagem-Movimento (aula 1 de 21)

“O cinema inventou uma percepção. A percepção no cinema é diferente da percepção nas condições naturais. O cinema nos propõe uma percepção que as condições naturais não nos podem dar, a saber: a percepção de um movimento puro. E se as condições da reprodução do movimento no cinema são condições artificiais, isso não significa que aquilo que o cinema reproduz seja artificial. Todo o artifício do cinema serve à construção dessa percepção de um movimento puro; ou de um movimento que tende ao puro, ao seu estado puro. O que é o fato da percepção cinematográfica? É que no cinema o movimento não se acrescenta à imagem. O movimento não se adiciona à imagem. Não há a imagem e depois o movimento. O que o cinema apresenta é uma imagem-movimento (com um pequeno traço, com um hífen). É uma imagem-movimento”.

Arte, Experimentação, Política

FILME: O Mínimo Gesto (1971) | Fernand Deligny

Por: Nicolas Philibert | Trad.: Rodrigo Lucheta  "Débil mental", dizem os especialistas. Tal como é no mínimo gesto, ele o é na vida cotidiana que levamos juntos há mais de 10 anos.... Tal como é, para nós ele é uma fonte inesgotável de riso o tempo todo, desde que chega. E neste filme como na… Continuar lendo FILME: O Mínimo Gesto (1971) | Fernand Deligny

Experimentação, Filosofia

O método de dramatização (1967), por Gilles Deleuze

Sob a organização, assim como sob a especificação, encontramos tão-somente dinamismos espaço-temporais: isto é, agitações de espaço, buracos de tempo, puras sínteses de velocidades, de direções e de ritmos. Então, as características mais gerais de ramificação, de ordem e de classe, e até as características genéricas e específicas, já dependem de tais dinamismos ou de tais direções de desenvolvimento. E, simultaneamente, sob os fenômenos partitivos da divisão celular, encontram-se ainda instâncias dinâmicas, migrações celulares, dobramentos, invaginações, estiramentos que constituem uma “dinâmica do ovo”. A esse respeito, o mundo inteiro é um ovo.

Arte, Experimentação, Política

Jim Morrison: dor, violência, liberdade.

Entrevista a Lizze James em 1967   Lizze James - Acho que os admiradores dos Doors o encaram como um salvador, um líder messiânico que os libertará. O que você acha? Essa não é uma imensa responsabilidade? Jim Morrison - Isso é um absurdo. Como se pode libertar alguém que não tem coragem para levantar-se… Continuar lendo Jim Morrison: dor, violência, liberdade.

Arte, Experimentação

O Barco Bêbado, poema de Arthur Rimbaud

“O Barco Bêbado” (1871), poema de Arthur Rimbaud, vivido por Léo Ferré, com tradução de Augusto de Campos.     O Barco Bêbado - Arthur Rimbaud Quando eu atravessava os Rios impassíveis,Senti-me libertar dos meus rebocadores.Cruéis peles-vermelhas com uivos terríveisOs espetaram nus em postes multicores. Eu era indiferente à carga que trazia,Gente, trigo flamengo ou… Continuar lendo O Barco Bêbado, poema de Arthur Rimbaud